terça-feira, 8 de agosto de 2017

Nova ameaça às árvores em Portugal: espécie de bactéria muito patogénica para oliveiras já está na Península Ibérica

Oliveiras seculares em Puglia, Itália, mortas pela Xylella fastidiosa. Foto daqui.
A bactéria Xylella fastidiosa, com origem na Califórnia, está a afectar desde 2013 os olivais de Puglia, Itália, e foi agora detectada, em Julho de 2017, em Alicante, Espanha.

A história, infelizmente, já é bem conhecida de todos nós. Uma doença de uma  espécie de plantas que antes existia apenas num local do mundo sem grande impacto é, como resultado de uma crescente globalização, introduzida acidentalmente noutro continente com resultados devastadores.

Nemátodo-do-pinheiro em PT. Via ICNF
Na segunda metade do século XIX, a filoxera, com origem no leste norte-americano, iniciava uma marcha pelas vinhas de todo o mundo deixando um rasto de destruição atrás de si. Na primeira metade do século XX, foi a vez de uma das espécies dominantes da floresta do leste norte-americano, o castanheiro-americano Castanea dentata, ser obliterada por um fungo asiático para o qual não tinha qualquer tipo de resistência. Na Europa, seria a grafiose-dos-ulmeiros, importada da América do Norte, a dizimar várias espécies de ulmeiros europeus na segunda metade do século XX.

Desde 1999, o nemátodo-da-madeira-do-pinheiro tem vindo a disseminar-se pelos pinhais de Norte a Sul do País. Nos últimos anos, o escaravelho-das-palmeiras, com origem na Ásia, tem vindo a dizimar as palmeiras do Sul da Europa, principalmente exemplares da palmeira-das-Canárias Phoenix canariensis.

Agora, é a vez de uma bactéria com origem na Califórnia ameaçar um leque vasto de espécies de interesse económico em Portugal, como a oliveira, o sobreiro, a videira e a amendoeira. Trata-se da Xylella fastidiosa (ver mais informação também aqui) e desde que apareceu em Itália em 2013 que tem causado muita preocupação e sido alvo de acompanhamento intenso. Em Itália foi denominada a mais grave ameaça à olivicultura italiana. Em Espanha, chamam-lhe o Ébola-das-Oliveiras, o que dá uma ideia dos receios dos agricultores.

A revista OliveOilTimes tem feito o acompanhamento do percurso conhecido desta bactéria por terras Europeias e aproximação a Portugal, noticiando o seu aparecimento nas Baleares em Novembro de 2016 e a sua identificação em Alicante, já na Península Ibérica continental, em Julho de 2017, o desenvolvimento que me levou a escrever este texto, face à rápida aproximação ao nosso país.

Recomendo a leitura deste artigo.
Também em Portugal se tem acompanhado o assunto. Recomendo a leitura do artigo na Vida Rural, da autoria de Paula Sá Pereira do INIAV-Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, pelo rigor e clareza da exposição e acessibilidade da linguagem. A mais recente referência que encontro a esta questão por cá data de 6 de Agosto de 2017 e é um registo na página do PCP-Partido Comunista Português de perguntas que o Eurodeputado Miguel Viegas fez por escrito à Comissão Europeia sobre esta questão, já depois da notícia da infecção de amendoeiras em Alicante.

A boa notícia, se se pode dizer assim, é que a sub-espécie detectada nas amendoeiras em Alicante, Espanha, não é a mesma que está a afectar as oliveiras em Puglia, Itália, esta última uma sub-espécie mais perigosa para os olivais. De facto, existem várias sub-espécies da bactéria com apetência preferencial por diferentes tipo de plantas. Mas a capacidade para se adaptar a novos hospedeiros é grande, infelizmente, e a presença desta nova sub-espécie em território europeu mostra a vulnerabilidade à múltipla introdução desta bactéria através da importação de plantas do exterior.

Uma das sub-espécies desta bactéria tem ainda o potencial para afectar várias espécies de carvalhos (género Quercus) onde se incluem os sobreiros Q. suber e azinheiras Q. rotundifolia. Temo especialmente qual o impacto que possa vir a ter sobre o sobreiro, já sobre enorme pressão fitossanitária nos últimos anos, devido ao aumento dos períodos de seca, intensificação do uso dos solos dos montados e importação de vários fungos.

Enfim, mais uma má notícia para a fitossanidade do nosso arvoredo autóctone e de interesse económico. Se chegar aos olivais intensivos da Andaluzia, e de seguida aos olivais intensivos em rápida e exponencial expansão em toda a área de influência da rega do Alqueva, vai encontrar vastas monoculturas com muito pouca variedade genética, um território fértil para a evolução e disseminação rápida. O resultado pode ser devastador.

Por várias razões - que vão da conservação da natureza à saúde das populações - deveria ser melhor pensada a forma como se está a permitir que seja feita a instalação contínua de monocultura de olival intensivo no Alentejo. É necessário minimizar os impactos ambientais e os riscos, como o aparecimento de um novo e agressivo agente patogénico. Infelizmente, uma vez instalada a bactéria, também os olivais tradicionais serão afectados, assim como as muitas oliveiras seculares e milenares que temos em Portugal. É uma possibilidade preocupante.

Esperemos que se consiga impedir as piores consequências. Fica o alerta.

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